A Procuradoria-geral da República (PGR) pediu a prisão preventiva da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), que foi condenada a 10 anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF), após ela sair do Brasil.
No pedido de prisão enviado a ministro Alexandre de Moraes, ao qual a BBC News Brasil teve acesso, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu o sequestro dos bens da deputada, a suspensão do seu passaporte e a inclusão de Zambelli na lista da Interpol, rede de cooperação internacional entre as polícias de diferentes países.
Gonet argumentou ainda que Zambelli deve ser considerada foragida “por ter se evadido para outro país e anunciado publicamente sua permanência na Europa e a transgressão da decisão condenatória proferida pela mais alta Corte do país, em que secominou pena a ser cumprida inicialmente em regime fechado”.
“Não se trata de antecipação do cumprimento da pena aplicada à ré, mas de imposição de prisão cautelar, de natureza distinta da prisão definitiva, com o fim de assegurar a devida aplicação da lei penal”, disse Gonet no pedido a Moraes.Caberá ao STF decidir sobre a prisão da deputada. A partir de então, as autoridades brasileiras deverão encaminhar o pedido para o país onde Zambelli está, que até agora não foi revelado.
Vai caber ao país no qual a deputada se encontra decidir se acata ou não a um eventual mandado de prisão expedido pela Justiça brasileira.
Zambelli afirmou na terça-feira (3/6) que deixou o Brasil em direção a um país da Europa e que vai se licenciar do cargo para, segundo ela, lutar contra o que classificou de “falta de liberdades” e “censura” no Brasil.
Caso a licença da parlamentar seja oficializada, quem assume é o Coronel Tadeu (PL-SP), que é policial militar da reserva e ex-deputado federal e atual suplente de Zambelli na Câmara dos Deputados.
“Gostaria de deixar bem claro que não é um abandono do país. Não é desistir da minha luta. Muito pelo contrário. É resistir. É continuar falando o que eu quero falar. Voltar a ser a Carla antes das amarras que essa ditadura nos impôs”, disse a parlamentar em entrevista à rádio Auriverde, em transmissão na manhã desta terça-feira.
Zambelli estaria fora do país desde o dia 25 de maio, e seguiu rumo à capital argentina, Buenos Aires, por onde deixou a América do Sul, segundo o portal UOL e a TV Globo.
A fronteira com a Argentina não exige controle migratório e, por isso, a saída de Zambelli não foi registrada oficialmente pela Polícia Federal (PF), noticiou a Globo.
A deputada não revelou em que país europeu ela estaria. Mais tarde, à CNN, ela disse que vai para a Itália e que, por ter cidadania italiana, não poderá ser deportada do país para retornar ao Brasil.
“Tenho cidadania italiana e nunca escondi, se tivesse alguma intenção de fugir eu teria escondido esse passaporte. Como cidadã italiana, eu sou intocável na Itália, não há o que ele possa fazer para me extraditar de um país onde eu sou cidadã, então eu estou muito tranquila quanto a isso”, afirmou à CNN.
Em um primeiro momento, Zambelli disse à CNN que já estava na Itália. Depois, seu marido informou que eles irão viajar para a Itália em poucos dias, mas que, no momento, os dois estão nos Estados Unidos. Não está claro, portanto, em que país se encontra atualmente a deputada.
A parlamentar afirmou ainda que vai solicitar uma licença não-remunerada da Câmara dos Deputados para seguir fora do país. Ela disse que o pedido será semelhante ao feito pelo deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que, desde fevereiro está vivendo nos Estados Unidos. De lá, ele vem fazendo campanha a favor de sanções contra o ministro do STF, Alexandre de Moraes.
À BBC News Brasil, o advogado Daniel Bialski, que representava Zambelli, disse que tinha sido “apenas comunicado pela deputada que estaria fora do Brasil para dar continuidade a um tratamento de saúde”.
Posteriormente, ele anunciou que motivos de “foro íntimo”, deixaria de representar a deputada.
A saída de Zambelli do Brasil acontece menos de um mês depois de ela ter sido condenada por unanimidade pela Primeira Turma do STF a 10 anos de prisão pela invasão de sistemas e pela adulteração de documentos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Apesar da condenação, ainda não havia mandado de prisão contra a parlamentar. A BBC News Brasil apurou que ela não tinha nenhuma restrição a viagens e que seu passaporte, que chegou a ser apreendido em 2023, já havia sido devolvido.
Zambelli disse que vai usar seu tempo fora do país para denunciar a perseguição política à qual militantes de direita estariam sendo submetidos no Brasil.
“O que nós estamos vivendo hoje é um tempo de ditadura, falta de liberdades, censura e acho que vocês precisam ter pessoas fora do Brasil para poder lutar e continuar denunciando, desta vez na Europa. Vou levar isso a todos os países da Europa. Vou denunciar em todas as cortes que a gente tiver pra denunciar”, afirmou a parlamentar.
Além da pena de prisão em regime fechado, a deputada foi condenada à perda do mandato e ao pagamento de indenização, por envolvimento na invasão do sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pelo crime de falsidade ideológica.
Zambelli foi acusada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de planejar e coordenar, com o auxílio do hacker Walter Delgatti, uma invasão ao sistema do CNJ no início de 2023.
Segundo a denúncia, o objetivo era incluir alvarás de soltura falsos e um mandado de prisão forjado contra Alexandre de Moraes.
Delgatti, que confessou o ataque, foi condenado a oito anos e três meses de prisão. Ele afirma ter feito a invasão a mando da deputada.
No voto que embasou a condenação, Moraes afirmou que Zambelli atuou de forma “premeditada, organizada e consciente”, com a intenção de desacreditar as instituições do Estado democrático de Direito.
“Como deputada federal, portanto representante do povo brasileiro e jurada a defender a Constituição, utilizou-se de seu mandato e prerrogativas para, deliberadamente, atentar contra a credibilidade do Poder Judiciário”, escreveu o ministro.
A pena, segundo ele, foi agravada pelo “comportamento social desajustado ao meio em que vive a acusada” e pelo “desrespeito às instituições e à democracia”.
A defesa da parlamentar argumenta que a condenação se baseou exclusivamente nos depoimentos de Delgatti, que seriam contraditórios e imprecisos.
Segundo os advogados, não houve pagamento por serviços ilegais e não há provas técnicas de que Zambelli tenha redigido ou enviado os documentos falsos incluídos no sistema do CNJ.